REJEIÇÃO DA ACUSAÇÃO/ELEMENTOS SUJECTIVOS DO TIPO

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REJEIÇÃO DA ACUSAÇÃO/ELEMENTOS SUJECTIVOS DO TIPO

2 de Fevereiro, 2023 Natividade Almeida Comments Off

Processo:
34/21.1PHAMD.L1-9

Relator:
PAULA PENHA

Data do Acórdão:
02-02-2023

Descritores:
REJEIÇÃO DA ACUSAÇÃO
ELEMENTOS SUJECTIVOS DO TIPO

Votação:
UNANIMIDADE

Meio Processual:
RECURSO PENAL

Decisão:
PROCEDENTE

Sumário:

I– A regra geral do nosso sistema penal assenta na punição das acções humanas típicas (elemento objectivo) e dolosas (elemento subjectivo), por serem estas que manifestam o desvalor jurídico mais grave e, simultaneamente, a culpa mais censurável.

Esta culpa sob a forma dolosa (ou dolo do tipo ou dolo do facto) constitui o elemento subjectivo do tipo criminal e que consiste: no conhecimento e vontade de realização da acção típica criminal, aquando da prática/no momento da conduta do agente.

II– Os elementos constitutivos do tipo-legal de crime de condução sem habilitação legal (na parte com interesse para o caso)são: a condução de veículo automóvel na via pública ou equiparada; sem que o condutor esteja habilitado com carta de condução; e o faça dolosamente.

Este último requisito (subjectivo) pressupõe: conhecimento e vontade de realização da acção típica criminal, aquando da prática/no momento da conduta do agente.

Isto é, decompõe-se em dois elementos: – O elemento cognitivo ou intelectual do dolo = diz respeito ao conhecimento pelo agente de todas as circunstâncias de facto e de direito constitutivas do respectivo tipo criminal. Isto é, o agente conheça os elementos descritivos (elementos apreensíveis pelos sentidos) e normativos (elementos cuja apreensão depende da pressuposição lógica de uma norma)que integram o respectivo tipo legal de crime respectivo tipo. E este conhecimento permite ao agente a orientação e decisão da sua consciência ética no sentido de preservar, ou não, o respectivo bem jurídico tutelado pelo respectivo tipo legal de crime; – O elemento volitivo do dolo = diz respeito à vontade do agente aquando da prática do facto. Isto é, pressupõe que o agente dirija a sua vontade à realização de um facto ilícito típico ou, pelo menos, se conforme com a realização de um facto ilícito típico.

III– O processo especial abreviado foi criado pelo legislador com vista à simplificação e aceleração da tramitação do processo penal, sobretudo nas fases preliminares e, até, podendo a identificação do arguido e a narração dos factos da acusação ser efectuada, no todo ou em parte, por mera remissão para o auto de notícia. Bastando que contenha a narração concreta, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena, isto é, dos factos constitutivos da prática do respectivo crime, previsto e punível por lei vigente aquando dos factos.

Compulsado o teor integral da concreta acusação pública, a mesma contém todos os sobreditos elementos necessários e suficientes e, por isso, deve considerar-se manifestamente fundada. Pois, caso venha a provar-se, em sede de julgamento, toda essa factualidade, a mesma é suficiente para se considerarem preenchidos todos os sobreditos elementos constitutivos do tipo legal de crime de condução sem habilitação legal e da sua autoria por parte do arguido.

Pois, naquelas descritas circunstâncias de tempo, modo e lugar, o arguido agiu de forma consciente e voluntária, ao conduzir um veículo automóvel, na via pública, mesmo sabendo que não tinha carta de condução, que tal conduta era proibida por lei e mesmo assim fê-lo. Sendo esta sua actuação, para além de ilícita (porque contrária ao dever-ser jurídico-penal),também culposa/dolosa/merecedora de um juízo de censura (porque este arguido não agiu em conformidade com o dever ser jurídico, embora tivesse podido fazê-lo, motivar-se por ele e realizá-lo. Isto é, embora tivesse podido e devido tê-lo feito, não o fez, assim optando por adoptar aquela conduta que sabia ser ilícita/contrária ao dever-ser jurídico).

IV– Mesmo que tivesse havido fundamento para uma rejeição liminar da acusação (que põs fim à fase de inquérito) não poderia haver lugar à remessa dos autos ao Ministério Público – contrariamente ao demais teor constante do despacho recorrido que, após rejeitar a acusação, ordenara a remessa dos autos aos Serviços do Ministério Público.

A este propósito é jurisprudência dominante dos nossos tribunais superiores que não é possível ordenar numa diferente fase processual o regresso à fase anterior, fazendo retroceder o processo de forma a sanar eventuais invalidades dessa antecedente fase processual.