Descritores: VIOLAÇÃO DO SEGREDO DE JUSTIÇA DIREITO À INFORMAÇÃO COMPATIBILIZAÇÃO DE DIREITOS
Votação: UNANIMIDADE
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Sumário:
I. Uma investigação compreende a realização de uma série de actos, destinados a alcançar a prova da verdade material, relativamente a um determinado incidente de vida. A divulgação pública de partes dessa investigação, cria fenómenos de percepção e de actuação cuja dimensão, em bom rigor e em grande medida, sempre se desconhecerão. II. Não é humanamente possível poder afirmar-se, com qualquer mínima segurança jurídica, que um determinado acto ou informação não criou qualquer prejuízo para uma determinada investigação. III. É possível fazer-se esse juízo pela positiva, isto é, determinar-se que, por virtude da informação pública de algo, alguém actuou sonegando, alterando, destruindo ou fugindo, pois o nexo causal poderá ser determinado, entre uma informação e uma acção. Já no que toca à omissão – nada foi prejudicado pela informação pública – tal afirmação mostra-se inalcançável, dada a enorme variedade de possibilidades que o conhecimento de uma determinada informação pode vir a suscitar, sem que a investigação das mesmas venha sequer a daquelas ter conhecimento. IV. Os elementos constitutivos do tipo de crime de violação do segredo de justiça, são os seguintes: – Que seja dado conhecimento, – de modo ilegítimo, – no todo ou em parte, – de teor de acto de processo penal que se encontre coberto por segredo de justiça; – qualquer que seja a qualidade do agente ou o facto de ter tido ou não contacto com o processo. – A actuação terá de revestir a forma de dolo. V. Da enunciação supra resulta que estamos perante um crime de mera actividade, uma vez que a tipificação legal não exige a produção de um resultado típico danoso, pois em parte alguma do normativo se mostra imposta a referência à necessidade de que da conduta desenvolvida pelo agente, resulte a verificação de um prejuízo, de um dano para a investigação ou para qualquer interveniente processual. VI. O argumentário expresso pelo tribunal “a quo”, no que concerne à primazia do direito à informação, afastando e sobrepondo-se ao segredo de justiça, não tem base que o suporte, precisamente porque tal direito estava acautelado, já que a informação relevante poderia ter sido dada, o público ficaria informado e não se poria em perigo o bom funcionamento da máquina da justiça. VII. O segredo de justiça que vigorava nos autos, não era impeditivo do direito do público a ser informado, pois a utilidade social da notícia mantinha-se, tivessem-se os arguidos abstido de aditar conteúdos protegidos pelo dito segredo de justiça. VIII. A inclusão de tais conteúdos, não se mostra necessária para que o público pudesse ter a percepção da gravidade dos factos em apreciação. Na verdade, não constassem tais conteúdos das ditas notícias, os fins de liberdade de expressão e de direito à informação mostrar-se-iam cumpridos, já que, por um lado, os arguidos poderiam expor a seriedade e gravidade dos casos em investigação e o público ficaria ciente dos contornos dos mesmos e, por outro, salvaguardava-se o bom funcionamento da justiça, numa fase processual ainda embrionária e frágil. IX. Assim, neste caso, cremos que se mostram harmonizados os preceitos constitucionais em eventual rota de colisão, designadamente os relativos à liberdade de imprensa, liberdade de expressão, direito à informação e o segredo de justiça, como modo protector (também ele com assento constitucional), do bem jurídico de bom funcionamento da máquina judiciária nas fases embrionárias do processo penal. (sumário elaborado pela relatora)
VIOLAÇÃO DO SEGREDO DE JUSTIÇA/ DIREITO À INFORMAÇÃO/ COMPATIBILIZAÇÃO DE DIREITOS
Processo:
2237/18.7T9LSB.L2-3
Relator:
MARIA MARGARIDA ALMEIDA
Data do Acórdão:
20-12-2023
Descritores:
VIOLAÇÃO DO SEGREDO DE JUSTIÇA
DIREITO À INFORMAÇÃO
COMPATIBILIZAÇÃO DE DIREITOS
Votação:
UNANIMIDADE
Meio Processual:
RECURSO PENAL
Decisão:
PROVIDO
Sumário:
I. Uma investigação compreende a realização de uma série de actos, destinados a alcançar a prova da verdade material, relativamente a um determinado incidente de vida. A divulgação pública de partes dessa investigação, cria fenómenos de percepção e de actuação cuja dimensão, em bom rigor e em grande medida, sempre se desconhecerão.
II. Não é humanamente possível poder afirmar-se, com qualquer mínima segurança jurídica, que um determinado acto ou informação não criou qualquer prejuízo para uma determinada investigação.
III. É possível fazer-se esse juízo pela positiva, isto é, determinar-se que, por virtude da informação pública de algo, alguém actuou sonegando, alterando, destruindo ou fugindo, pois o nexo causal poderá ser determinado, entre uma informação e uma acção. Já no que toca à omissão – nada foi prejudicado pela informação pública – tal afirmação mostra-se inalcançável, dada a enorme variedade de possibilidades que o conhecimento de uma determinada informação pode vir a suscitar, sem que a investigação das mesmas venha sequer a daquelas ter conhecimento.
IV. Os elementos constitutivos do tipo de crime de violação do segredo de justiça, são os seguintes:
– Que seja dado conhecimento,
– de modo ilegítimo,
– no todo ou em parte,
– de teor de acto de processo penal que se encontre coberto por segredo de justiça;
– qualquer que seja a qualidade do agente ou o facto de ter tido ou não contacto com o processo.
– A actuação terá de revestir a forma de dolo.
V. Da enunciação supra resulta que estamos perante um crime de mera actividade, uma vez que a tipificação legal não exige a produção de um resultado típico danoso, pois em parte alguma do normativo se mostra imposta a referência à necessidade de que da conduta desenvolvida pelo agente, resulte a verificação de um prejuízo, de um dano para a investigação ou para qualquer interveniente processual.
VI. O argumentário expresso pelo tribunal “a quo”, no que concerne à primazia do direito à informação, afastando e sobrepondo-se ao segredo de justiça, não tem base que o suporte, precisamente porque tal direito estava acautelado, já que a informação relevante poderia ter sido dada, o público ficaria informado e não se poria em perigo o bom funcionamento da máquina da justiça.
VII. O segredo de justiça que vigorava nos autos, não era impeditivo do direito do público a ser informado, pois a utilidade social da notícia mantinha-se, tivessem-se os arguidos abstido de aditar conteúdos protegidos pelo dito segredo de justiça.
VIII. A inclusão de tais conteúdos, não se mostra necessária para que o público pudesse ter a percepção da gravidade dos factos em apreciação. Na verdade, não constassem tais conteúdos das ditas notícias, os fins de liberdade de expressão e de direito à informação mostrar-se-iam cumpridos, já que, por um lado, os arguidos poderiam expor a seriedade e gravidade dos casos em investigação e o público ficaria ciente dos contornos dos mesmos e, por outro, salvaguardava-se o bom funcionamento da justiça, numa fase processual ainda embrionária e frágil.
IX. Assim, neste caso, cremos que se mostram harmonizados os preceitos constitucionais em eventual rota de colisão, designadamente os relativos à liberdade de imprensa, liberdade de expressão, direito à informação e o segredo de justiça, como modo protector (também ele com assento constitucional), do bem jurídico de bom funcionamento da máquina judiciária nas fases embrionárias do processo penal.
(sumário elaborado pela relatora)
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